20 de janeiro de 2009

A neve

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Batem leve, levemente,
como quem chama por mim...
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim...
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É talvez a ventania;
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...
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Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento, com certeza.
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Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudade, Deus meu!
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Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...
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Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
de uns pezitos de criança...
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E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
- depois em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...
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Que quem já é pecador
sofra tormentos... enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!
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E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na natureza...
– e cai no meu coração.
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Augusto Gil - Luar de Janeiro, 1909

1 comentário:

Anabela Magalhães disse...

Pois, desta vez são vocês!!! :(
Aqui à volta, Marão e Aboboreira acordaram branquinhos!
Em Amarante nem vê-la.